Incontinência Urinária e Saúde Mental: Uma Reflexão à frente do Setembro Amarelo

Incontinência Urinária e Saúde Mental: Uma Reflexão à frente do Setembro Amarelo

Reconhecer o Setembro Amarelo, mês dedicado à prevenção do suicídio e à valorização da saúde mental, é também reconhecer a necessidade de atenção aos sinais sutis que muitas vezes se escondem na rotina das pessoas. O cuidado com a mente, no entanto, não pode ser restrito somente a um período do ano, deve ser contínuo, pois os desafios emocionais acompanham cada etapa da vida, Neste cenário, a incontinência urinária (IU) merece visibilidade. Apesar de sua elevada prevalência, sobretudo entre mulheres, ainda é pouco valorizada como fator que compromete não apenas a qualidade de vida, mas também a autoestima, favorecendo o surgimento ou agravamento de quadros de ansiedade e depressão. Este texto convida à reflexão sobre o caminho entre saúde mental e IU, ressaltando a importância de inserir esse diálogo no cotidiano, para além das campanhas sazonais.

Avançando nessa discussão, cabe destacar que a IU, definida pela perda involuntária de urina, afeta uma proporção significativa da população feminina. Dados da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU) indicam que cerca de 30% das mulheres com IU desenvolvem quadros de depressão e ansiedade, com repercurssões que atravessam a auto imagem, o convívio social, a vida profissional e até a esfera da sexualidade¹.

Corroborando esses achados, estudos nacionais reforçam a ligação entre IU e saúde mental. Uma revisão integrativa publicada no Brazilian Journal of Health Review identificou forte correlação entre IU e maior prevalência de depressão, ansiedade e isolamento social entre idosos brasileiros². Da mesma forma, pesquisa conduzida no Hospital Universitário Ana Bezerra, da UFRN, evidenciou que mulheres com IU apresentam pior percepção de sua saúde, com reflexos negativos sobre suas atividades diárias, interações sociais e estado emocional³.

Somando-se a isso, é fundamental e importante lembrar que fatores de riscos como envelhecimento, menopausa e condições crônicas, aumentam as chances de desenvolver IU. Estudos apontam que cerca de 20% dos idosos apresentam a condição, com impactos na autopercepção da saúde. Em mulheres acompanhadas por mais de nove anos, a persistência dos sintomas mostrou-se associada a maior risco de depressão, revelando um ciclo de agravamento físico e emocional4.

Ampliando a perspectiva, observa-se que o problema é global. Pesquisas internacionais confirmam a associação consistente entre IU, sintomas depressivos e isolamento social em diferentes faixas etárias, reforçando a necessidade de um olhar integral que contemple corpo e mente5.

Diante desse cenário, torna-se urgente compreender a IU como uma condição que ultrapassa o limite fisiológico e alcança a dimensão emocional. Embora muitas vezes vista apenas como um desconforto íntimo, a IU é um sinal de que algo não está bem na saúde pélvica e, apesar de ser tratável e prevenível, frequentemente é minimizada ou normalizada, especialmente pelas mulheres, como se fossem apenas “algumas gotinhas” no dia a dia. Essa naturalização dos sintomas, que muitas vezes começam como pequenas perdas, traz o risco de evoluir para comprometimentos emocionais e sociais significativos, impactando autoestima, qualidade de vida e equilíbrio mental.

Ao retomarmos o espírito do Setembro Amarelo e avançarmos para os próximos meses, somos desafiados a ampliar o acesso a informações confiáveis sobre saúde pélvica, reforçando que a IU merece atenção e cuidado, rompendo o silêncio que a mantém invisível.

Por isso, convidamos você para promover conhecimento, quebrar tabus e fortalecer a rede de apoio. Envolver uma equipe interdisciplinar como médicos urologistas, uro-ginecologistas, enfermeiros especialistas, fisioterapeutas, psicólogos, nutricionistas e outros profissionais para garantir uma reabilitação que seja completa, cuidando ao mesmo tempo do corpo e da mente. Afinal, falar de IU é também falar de dignidade, saúde mental e controle.

Referências bibliográficas

1. DE OLIVEIRA, MJP; NOGUEIRA, EA de J. Avaliação do impacto da incontinência urinária na saúde mental de idosos: revisão integrativa de literatura. Revista Brasileira de Revisão de Saúde , [S. l.] , v. 5, pág. 23602–23609, 2023. DOI: 10.34119/bjhrv6n5-416. Disponível em: https://ojs.brazilianjournals.com.br/ojs/index.php/BJHR/article/view/63595. Acesso em: 29 set. 2025.
2. Sociedade Brasileira de Urologia, Seção São Paulo. Incontinência urinária acende alerta sobre casos de depressão relacionados ao distúrbio [Internet]. São Paulo: SBU-SP; [citado em 2025 Out 1]. Disponível em: https://sbu-sp.org.br/publico/incontinencia-urinaria-acende-alerta-sobre-casos-de-depressao-relacionados-ao-disturbio/
3. Alencar-Cruz JM, Lira-Lisboa L. O impacto da incontinência urinária sobre a qualidade de vida e sua relação com a sintomatologia depressiva e ansiedade em mulheres. Rev Salud Pública (Bogotá). 2019;21(4):390-397. doi:10.15446/rsap.v21n4.5001
4. Kessler M, Völz P, Bender JD, Nunes BP, Machado KP, Saes MO, Soares MU, Facchini LA, Thumé E. Effect of urinary incontinence on negative self-perception of health and depression in elderly adults: a population-based cohort. Cien Saude Colet. 2022;27(6):2259-2267. doi:10.1590/1413-81232022276.10462021
5. Robson M. The impact of incontinence on mental health. Br J Community Nurs. 2025 Apr 1;30(Sup4a):S39-S42. doi: 10.12968/bjcn.2025.0051. PMID: 40198341.

Marta Lira Goulart

Estomaterapeuta / Mestre em Ciências da Saúde. Responsável pelo Serviço de Reabilitação Pélvica Clínica Convacare. Membro do Conselho Científico Seccional SOBEST – SP

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