As feridas invisíveis também importam e merecem a nossa atenção

As feridas invisíveis também importam e merecem a nossa atenção

Neste mês, a campanha “Janeiro Branco” é adotada como uma forma de alertar sobre a importância da saúde mental e emocional em todo o mundo.

Cabe ressaltar que, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), Saúde Mental é um estado de bem-estar, que permite ao indivíduo utilizar suas habilidades, lidar com resiliência ao estresse rotineiro, produzir e contribuir com a comunidade no qual está inserido. Sendo assim, trata-se de um conceito muito mais amplo do que a ausência de doenças.

A Organização Panamericana de Saúde (OPAS) lembra ainda que, a Saúde Mental é um direito humano universal, que influencia no modo como cada um age, pensa e sente, além de permitir que as pessoas tomem decisões, construam relacionamentos e moldem o mundo em que vivem.

Em 2022, a OMS divulgou resultados da sua maior revisão mundial sobre saúde mental e os resultados foram impactantes. Foi identificado que, em 2019, quase um bilhão de pessoas no mundo viviam com um transtorno mental, sendo que o suicídio foi responsável por mais de 1 em cada 100 mortes e 58% destes casos ocorreram com pessoas com menos de 50 anos de idade.

A estimativa é de que no mundo, 1 a cada 8 pessoas convivam com algum tipo de transtorno mental, sendo 60% dos casos de ansiedade e depressão.

Dos países da América Latina, o Brasil lidera o ranking de países com maior prevalência de depressão, além de ser o segundo país com maior prevalência nas Américas.

Somos seres multidimensionais, formados por aspectos biológicos, sociais, espirituais e psicológicos, onde todos esses aspectos estão conectados e se interrelacionam o tempo todo. Desse modo, torna-se evidente a importância de estarmos preparados para avaliar, contribuir e cuidar da saúde mental daqueles que assistimos e cuidamos.

Neste ponto, cabe ressaltar que o cuidado com o sofrimento psíquico pode e deve ser adotado por todo e qualquer profissional. Estratégias como o acolhimento, a escuta ativa, a comunicação empática e o reconhecimento de demandas psíquicas complexas e específicas, que precisam ser encaminhadas para profissionais de saúde mental, devem ser adotadas por todos os profissionais que assistem o paciente, visando um cuidado mais amplo, adequado e que atenda às reais necessidades dos indivíduos atendidos.

É importante lembrar que a família, os cuidadores formais e informais e todos os que fazem parte do círculo social e auxiliam nos cuidados dos pacientes também merecem nossa atenção, avaliação e cuidado. Quanto maior o grau de dependência e a necessidade de auxílio para a Atividades Básicas e Instrumentais de Vida Diária (ABVD´s e AIVD´s), maior a sobrecarga de quem cuida.

Com a mudança do perfil epidemiológico caracterizado pelo envelhecimento populacional vinculado ao aumento de condições crônicas de saúde, apresentamos cada vez mais em nosso país, situações em que idosos cuidam de idosos ou onde os próprios familiares precisam se organizar para cuidar de um ente enfermo, buscando conciliar com suas outras atividades rotineiras. Este cenário tem contribuído para o aumento de quadros de estresse do cuidador.

Outro ponto de extrema importância é o olhar para a saúde mental dos profissionais. Os que cuidam frequentemente estão expostos a estresse, intenso sofrimento e condições insalubres de trabalho.

Pensando na definição de saúde mental estabelecida pela OMS descrita anteriormente, se a saúde mental está prejudicada, a capacidade de tomar decisões, exercer a empatia e cuidar pode ser afetada. Portanto, o autoconhecimento e autocuidado são fundamentais para todos os profissionais e devem ser uma de suas prioridades.

Ainda de acordo com a OMS, o ambiente de trabalho deve ser um dos principais responsáveis na adoção de medidas para prevenir problemas de saúde mental, destacando a importância de ações para garantir a segurança, o apoio e condições decentes de trabalho, bem como medidas que evitem a discriminação de quem apresenta algum transtorno mental.

Conforme foi estabelecido pela OPAS, todos devem ter o direito de viver uma vida com dignidade, equidade, igualdade e respeito e isso, sem dúvidas, inclui saúde mental de qualidade.

A promoção da saúde mental e emocional é multifatorial e exige ações coletivas e individuais. Para que seja alcançada, é necessário o envolvimento de todas as esferas do governo, fortalecimento das políticas públicas, engajamento dos gestores de serviços de saúde, formação adequada aos profissionais para lidar com o sofrimento psíquico, recursos adequados aos serviços de saúde, fortalecimento do trabalho em rede e desenvolvimento de ambientes com melhores condições de trabalho.

Há um longo caminho a ser percorrido para que saíamos do ranking de países com o maior número de pessoas em sofrimento mental e emocional do mundo, mas que não deixemos de fazer o que podemos, mesmo quando não podemos mudar tudo.

Que juntos possamos aperfeiçoar o olhar e o cuidado também com as feridas da alma (as nossas e as de quem cuidamos)!

Referências

· BOMBARDA, T.B; MENEGUSSI, J.M. Estresse de Familiares e Cuidadores. In: CASTILHO, R.K; SILVA, V.C.S.; PINTO, C.S. Manual de Cuidados Paliativos da Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Rio de Janeiro: Atheneu, 3.ed. 2021. p.553-555.
· INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Relações entre as alterações históricas na dinâmica demográfica brasileira e os impactos decorrentes do processo de envelhecimento da população. Rio de Janeiro: IBGE, Coordenação de População e Indicadores Sociais, 2016.
· ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DE SAÚDE (OPAS). OMS destaca necessidade urgente de transformar saúde mental e atenção. [página online]. OPAS: 2022. Disponível em: <https://www.paho.org/pt/noticias/17-6-2022-oms-destaca-necessidade-urgente-transformar-saude-mental-e-atencao>. [Acesso em 20 de janeiro de 2024]
· WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). The World health report: Mental health : new understanding, new hope. World Health Organization (WHO); 2001. Disponível em: < https://iris.who.int/handle/10665/42390>. [Acesso em 20 de janeiro de 2024].
· WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). Comprehensive mental health action plan 2013–2030. World Health Organization.2021. Disponível em: < https://iris.who.int/handle/10665/345301>. [Acesso em 20 de janeiro de 2024].
· WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). World mental health report: transforming mental health for all. Geneva: World Health Organization (WHO); 2022. Disponível em: <https://iris.who.int/bitstream/handle/10665/356119/9789240049338-eng.pdf?sequence=1>. [Acesso em 20 de janeiro de 2024].

Caroline Silveira

Caroline Silveira (COREN-SP: 397.168)
Enfermeira pelo Centro Universitário São Camilo; Mestre em Ciências pela EE-USP; Especialização na modalidade de Residência Multiprofissional em Saúde do Idoso e Cuidados Paliativos pelo HC-FMUSP; Título de especialista em Enfermagem em Cuidados Paliativos pela ABEN e ANCP; Pós-graduada em Enfermagem em Estomaterapia pelo Centro Universitário São Camilo; Habilitada em Laserterapia para o tratamento de feridas pela Zion Saúde; Habilitada em Podiatria Clínica pela Clipodis. Atualmente proprietária da Aflorar – Serviços de Enfermagem e Educação em Saúde, tendo como áreas de estudo e atuação: Saúde do Idoso; Cuidados Paliativos; Estomaterapia; Podiatria Clínica; Atenção Domiciliar.

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