Cuidados essenciais às pessoas com traqueostomia

Cuidados essenciais às pessoas com traqueostomia

A traqueostomia é uma das mais antigas estomias já realizada, é dada por meio de uma abertura em um segmento do aparelho respiratório, preferencialmente confeccionada no centro cirúrgico, sendo de caráter emergencial ou eletivo, temporário ou definitivo, tendo uma cânula inserida na parede anterior da traqueia cervical para liberação das vias aéreas superiores1-4.

Com relação causas que levam a realização de uma traqueostomia, destaca-se as de origem traumática, tumoral, infecciosa, protetiva, dentre outras. Sua confecção pode levar a alterações na imagem corporal, além de modificar a comunicação da pessoa com estomia e interferir na autonomia para o autocuidado5-7.

Neste contexto a equipe de enfermagem deve estar capacitada para as especificidades deste cuidado, e ciente de que práticas inconsistentes podem levar a pessoa com traqueostomia a insuficiência respiratória, aumentando de forma considerável a ocorrência deste evento adverso.

Assim, cabe ao enfermeiro o planejamento da sistematização da assistência de enfermagem, permitindo que o processo de enfermagem seja realizado, mitigando danos decorrentes dos procedimentos relacionados com os cuidados com às pessoas com traqueostomias.

Faz parte deste cuidado intervenções referentes a higiene pessoal, cuidados com a ferida operatória, cuidados direto com a traqueostomia e com a cânula (aspiração, higienização e fixação), estratégias para comunicação e o planejamento para decanulação segura, quando possível.

Assim, a seguir traremos cuidados a serem realizado pelos profissionais de enfermagem e cuidadores durante o cuidado direcionado às pessoas com estomias respiratórias no domicílio.

Cuidados com a higiene pessoal:

  • Realizar a higiene das mãos antes dos cuidados com a traqueostomia, seja pelos profissionais, cuidadores ou no autocuidado, o qual evita infecções secundárias decorrentes da microbiota transitória2,8,9.
  • Realizar a higiene da cavidade oral, com escovação de dentes língua e bochechas, em intervalos regulares, o qual evita a formação de biofilme e placas secas 2,8,9.

Cuidados com a ferida operatória:

  • Calçar luvas de procedimento não estéril;
  • Realizar a limpeza da ferida operatória friccionando gazes embebidas em água potável e sabonete líquido, preferencialmente;
  • Enxaguar com gazes embebidas em água potável, com cuidado para que não entre pelo orifício da estomia;
  • Secar a pele delicadamente com toalha limpa (não reutilizar a toalha)1,3,6,12.
  • Observar a ferida operatória após a limpeza quanto a presença de hiperemia, edema, dor sem controle com a medicação prescrita, mudança de coloração ou aumento de exsudato (sanguinolento, sero-sanguinoleto ou purulento), presença de odor 3,6. Nestas situações a pessoa dever ser encaminhada para hospital de origem.

Cuidados com a estomia

  • Proteger a traqueostomia durante o banho, fechando com o dedo, da mão já higienizada, ou com protetores específicos a fim de evitar entrada acidental de água;
  • Higienizar a cânula interna da traqueostomia com gazes levemente umedecidas com água morna pelo menos três vezes ao dia e sempre que houver a presença de sujidade visível;
  • Higienizar a pele do pescoço com água e sabonete, presencialmente líquido, pelo menos uma vez ao dia, com atenção para enxague cauteloso desta região;
  • Avaliar a pele ao redor durante a higienização e/ou durante a troca dos curativos, atenção para sinais de dermatites, com a presença de hiperemia, de edema, aumento da temperatura da pele, além da presença e características do exsudato2,3,8.
  • Aplicar protetores de espumas ou gazes (duas gazes de cada lado) ao redor da cânula para evitar seu contato direto com a pele;

Obs: Não cortar a gazes, pois as linhas soltas podem cair no orifício da estomia e obstruí-la;

  • Utilizar protetores de traqueostomia de tecido, ou afins, para evitar entrada acidental de poeira, folhas, insetos ou outras sujidades após a alta, isto é em domicílio2-4,8,10.
  • Fazer inalações com solução fisiológica 0,9% para fluidificar o muco, facilitando sua remoção a partir do reflexo de tosse10,11.

Cuidados com a cânula de traqueostomia:

  • Limpeza da cânula:
  • Cânulas sem intermediário: Limpar a cânula com gaze levemente umedecida com solução fisiológica 0,9%, pelo menos três vezes ao dia e sempre que houver a presença de sujidade;
  • Cânulas com intermediário: Remover e limpar o intermediário da cânula de traqueostomia com água potável e o auxílio de gaze ou escovas para limpeza de traqueostomias, pelo menos três vezes ao dia e sempre que notar a presença de sujidade;
  • Fixação da cânula:
  • Manter a cânula fixa com cadarço ou outro tipo fixação em volta do pescoço;
  • ;
  • Para trocar/remover o cadarço com segurança, procurar realizar com duas pessoas:
    • Primeiro coloque cadarço limpo, amarre com dois nós, após retire o sujo, fazendo isso em ambos os lados da cânula – atenção para não deixar frouxa a fixação, assegure-se que a cânula não saía acidentalmente;

Obs: Se utilizar outro tipo de fixação como velcro, coloque a limpa e solte a suja em ambos os lados.

  • Deixar uma folga em torno de 1 cm a 2 cm ou dois dedos para evitar lesão por pressão causada pela fixação;
    • Trocar o cadarço ou fixação e avaliar a pele ao redor da traqueostomia pelo menos uma vez ao dia, de preferência após a higiene da pele do pescoço;
  • Preenchimento do balonete/cuff interno
    • Verificar a pressão do cuff interno uma vez ao dia que deve estar entre 25-35 mmHg ou entre 20-30 cmH2O, esta é a concentração ideal para que não ocorra lesões na mucosa da traqueia como isquemia dos vasos e alterações na mucosa traqueal13;
    • A pressão do balonete para crianças deve ser mensurada e mantida no máximo até 15 mmHg ou 20 cm H2012;.

Cuidados com a aspiração da traqueostomia:

A aspiração da traqueostomia é realizada com o mesmo cateter usado para aspirar a cânula de intubação orotraqueal. Entretanto, os trajetos são diferentes e a cânula da traqueostomia é menor do que a cânula intubação orotraqueal, assim considerar este aspecto durante o procedimento.

Obs:Na técnica limpa modificada, as luvas não precisam ser estéreis, mas os cateteres deverão ser estéreis e descartáveis.

Obs: a espessura do cateter, não deve ultrapassar 2/3 do diâmetro interno da cânula e a profundidade não deve ultrapassar o limite inferior da cânula, para evitar traumas na traqueia.

 enrolar uma porção na mão dominante, deixando livre aproximadamente 10 cm da sua parte distal de forma estéril;

Obs: Quando estímulo de tosse, tracionar o cateter cerca de 1 cm;

6. Liberar a sucção e proceder a retirada do cateter com movimentos rotatórios – não aplicar a sucção por mais de 15 segundos;

7. Observar a quantidade e as características do muco aspirado (se espessa, ou umidificada), coloração (se esverdeada, amarelada, sanguinolenta ou esbranquiçada) e a presença de odor1,3,8,12.

  • spirar de 5 em 5 minutos, sem ultrapassar 15 segundos; realizar a aspiração traqueal sempre quando houver sinais de desconforto respiratório, aumento da frequência respiratória e/ou ruído excessivo vindo de vias aéreas, isto é, sempre que for necessário;

ATENÇÃO

  • A profundidade inserida do cateter, não deve ultrapassar dois terços do calibre da cânula;
  • Medidas seguras, como técnica limpa e estéreis para evitar infecção cruzada;
  • O profissional que irá realizar o procedimento, manter-se ao lado do paciente (à direita de destro ou a esquerda se canhoto), nunca de frente.

FATORES IMPORTANTES

  • As inalações auxiliam na umidificação regular do muco, mantendo maior fluidez e, consequentemente, de fácil remoção;
  • A mobilidade física ao deambular, a posição mais próxima de sentada e os exercícios respiratórios adequados auxiliam na redução do acúmulo de secreção. 3,6,8,10,12
  • Nunca retira o conjunto de cânula e intermediário completo, caso ocorra a decanulação acidental, procurar imediatamente a emergência do hospital3,5,10,12.
  • Nebulização com solução salina são orientadas apenas para o domicílio, após a pandemia de COVID 19, nos ambientes hospitalares, são realizadas por puff, exemplo: bombinha de salbutamol10.

Estratégias para comunicação:

  • Incentive a pessoa com traqueostomia a expressar seus desejos e suas necessidades para sua família, cuidadores ou com os próprios profissionais que estão realizando os cuidados;
  • As estratégias para comunicação envolvem a comunicação verbal e não verbal:
  • gestos, mímicas, uso de papel e caneta, lousas mágicas, recursos como válvulas de fala, tubos de traqueostomia falantes, que possibilitam a comunicação entre o paciente e seus familiares e cuidadores, entre sua rede de apoio, sua equipe multidisciplinar e o acompanhamento de profissionais especializados no processo de reabilitação do paciente2,3,8,11,14.

Cuidados no processo de decanulação segura:

  • Identificar os critérios para o desmame até a retirada da traqueostomia, sendo um procedimento seguro, livre de danos e riscos às pessoas com traquestomizadas, para evitar complicações ou tomada de decisão antecipada;
  • A pessoas precisa estar apta para o processo de decanulação, e para isso, exames endoscópicos podem facilitar a avaliação do trajeto das vias aéreas, o que pode ser um recurso associado para a segurança do paciente3,7;
  • Outro critério a ser considerado neste processo é que a pessoa não deve ter sido submetida a ventilação mecânica no mínimo 3 meses antes da decanulação;
  • A higiene brônquica tem de ser eficaz, após o uso da traqueostomia e a função pulmonar deve ter o reflexo da tosse preservado3,12.

Desde a fase inicial da construção da traqueostomia, o planejamento para a alta hospitalar deve ser considerado, contemplando o acompanhamento familiar ou do cuidador, com foco nos sinais de ansiedade, depressão e estresse, além dos aspetos de ordem práticas. O papel educativo também deve estar presente desde o início, o apoio de materiais educativos com orientações à pessoa e à família, contendo linguagem clara e objetiva, é fundamental neste processo. E por fim, e não menos importante, outro fator primordial a ser considerado para o cuidado completo é o acompanhamento interprofissional, onde nutricionista, fonoaudióloga, fisioterapia, entre outros profissionais, desenvolvem seus projetos terapêuticos frente as demandas apresentadas pelas pessoas com traqueostomias8,14,15.

A capacitação da equipe de enfermagem é essencial para um cuidado seguro, onde a prevenção e o gerenciamento dos riscos são fundamentais no processo de reabilitação desta pessoa4,6. O fortalecimento da autonomia, a recuperação da autoestima, o processo de ressignificação da imagem corporal, corroboram de forma significativa para melhoria da qualidade de vida destas pessoas.

REFERÊNCIAS

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Célia Regina da Silva é Enfermeira Estomaterapeuta no Especializado em Estomaterapia do IAMSPE (Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual) desde 2021, Especialização em Estomaterapia, pelo Instituto de Ensino Professor Dr. Cleber Leite Eireli em Santo André (2023), Especialização em Saúde Pública pela Instituição UNIFESP – Universidade Federal de São Paulo (2011), Especialização em Docência do Ensino Médio, Técnico e Superior na área da Saúde pela Instituição FAB – Faculdade Associada Brasil (2011), GRADUAÇÃO em Enfermagem na Instituição Centro Universitário Sant’Anna (2009) e Associada a SOBEST.

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